
TRF6 garante direito de estudante com deficiência auditiva à inscrição em cotas do IFMG
Decisão reconhece que exigir origem escolar pública para acesso às vagas de pessoas com deficiência viola princípios constitucionais de inclusão e igualdade.
Belo Horizonte — Em decisão proferida nesta segunda-feira (6), o Tribunal Regional Federal da 6ª Região (TRF6) concedeu tutela recursal de urgência para assegurar a inscrição de um estudante com deficiência auditiva bilateral total no processo seletivo do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Minas Gerais (IFMG), na condição de candidato às vagas reservadas a pessoas com deficiência (PCD), independentemente de ter cursado escola pública.
A medida foi deferida pelo desembargador federal Lincoln Rodrigues de Faria, que analisou o agravo de instrumento nº 6008985-70.2025.4.06.0000/MG, interposto contra decisão da 20ª Vara Federal Cível da Seção Judiciária de Minas Gerais. O juízo de primeiro grau havia indeferido liminarmente o pedido formulado em mandado de segurança, sob o argumento de que o candidato não preenchia o requisito de origem escolar pública, exigido pelo Edital nº 786/2025 do IFMG.
Na decisão, o magistrado reconheceu que a cláusula editalícia impugnada é "manifestamente incompatível com o regime jurídico protetivo instituído pela legislação brasileira", afirmando que subordinar o critério da deficiência à escolaridade pública "esvazia a finalidade da política afirmativa, invertendo sua lógica e desvirtuando sua razão de ser".
O desembargador destacou que o critério da deficiência é autônomo, amparado por normas de hierarquia constitucional, como a Convenção Internacional sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência (Decreto nº 6.949/2009), a Lei Brasileira de Inclusão (Lei nº 13.146/2015) e a Lei nº 14.768/2023, que define de forma objetiva a deficiência auditiva.
Em sua fundamentação, o relator ressaltou que "a deficiência constitui, por definição legal e normativa, um fator de vulnerabilidade que justifica políticas públicas específicas de inclusão", sendo ilegítimo restringir o acesso de pessoas com deficiência às cotas em razão do tipo de escola frequentada.
A decisão faz referência ainda ao princípio da vedação ao retrocesso social, lembrando que "conquistas históricas em matéria de direitos fundamentais não podem ser restringidas por atos administrativos que diminuam o patamar de proteção já consolidado".
Com base nesses fundamentos, o TRF6 determinou que o IFMG proceda imediatamente à inscrição do estudante nas vagas destinadas a pessoas com deficiência, garantindo-lhe o direito de participar do certame em igualdade de condições.
Os advogados Johnny Soares e Pâmmela Drumond, do escritório Soares Drumond Advogados, atuaram em defesa do estudante agravante, sustentando a autonomia do critério de deficiência e a inconstitucionalidade da exigência de origem escolar pública, sob o argumento de que tal restrição afronta o princípio da isonomia e o direito à educação inclusiva assegurado pela Constituição Federal e pela Convenção Internacional sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência.
A decisão foi comunicada com urgência à instituição de ensino e ao juízo de origem para cumprimento.
O caso teve início com mandado de segurança impetrado pela defesa do estudante, representado por sua mãe, que alegou ser discriminatória a exigência de origem escolar pública como condição para disputar as vagas destinadas a pessoas com deficiência. O pedido sustentou que o critério fere os princípios da isonomia, razoabilidade e inclusão educacional, transformando o sistema de cotas — concebido como instrumento de justiça social — em mecanismo de exclusão.
Com a decisão, o TRF6 reafirma a necessidade de interpretação inclusiva e constitucionalmente adequada das normas sobre ações afirmativas, garantindo que a condição de deficiência, por si só, seja reconhecida como suficiente para assegurar o acesso igualitário à educação pública federal.